terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Duas Europas

(resisti à tentação do trocadilho com o título do Charles Dickens, respirem aliviados)

Creio que os mercados de dívida soberana européia contam duas histórias diferentes, que refletem a estratégia da União Européia / Banco Central Europeu / Illuminati para o continente:

1. Países pequenos podem / devem ser forçados a renegociar suas dívidas (vulgo calote organizado), já que isso aliviaria muito a situação fiscal deles e não causaria impactos sistêmicos para o mercado financeiro (bancos, seguradoras, etc). Essa é a história de Portugal e Grécia, cujos juros de mercado excluem qualquer cenário de sustentabilidade da dívida (curioso foi ouvir hoje do Marcos Uchôa, no Bom Dia Brasil, que Portugal está pagando "juros estratosféricos, 16%, algo inviável para qualquer país". Viva o Brasil, que, nos últimos anos, cansou de se financiar à taxas maiores que essa:



2. Para os grandes emissores de dívida, onde qualquer possibilidade de renegociação causaria grandes abalos nos bancos, foi traçada uma linha. Imagino que o BCE tenha assumido um compromisso implícito de comprar quanto for necessário de dívida acima de uma determinada taxa. O mercado, tendo isso em mente e o dinheiro barato do LTRO, faz o resto do serviço e empurra os juros para baixo (levando todo o ganho de carregamento dos títulos). Isso tem valido para Espanha e Itália: no primeiro caso, os juros de dez anos estão perto da mínima em um ano; no segundo, tentam se firmar abaixo de 6%, o número que, por uma regra de bolso calculada por muita gente, é o limite para o serviço da dívida não degringolar as contas fiscais:


Com isso, espera-se comprar o tempo necessário para que as medidas de austeridade fiscal façam efeito. Acho baixa a probabilidade de funcionarem no médio / longo prazo - sem crescimento, a maioria dos países terá muita dificuldade em atingir as metas de déficit máximo sem agravar o problema do desemprego, isso sem contar os esqueletos que ainda devem aparecer no caminho. Até isso ficar claro, porém, os otimistas podem contar com uma trégua e tentar empurrar os preços para cima.

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

O que perdi semana passada

- O Fed agora tem uma meta explícita de inflação - e, ao mesmo tempo, se comprometeu a deixar os juros de um dia a zero até o final de 2014. Na terra de Bernanke, isso é compatível, partindo do princípio de que o risco de deflação ainda existe (a inflação esperada está abaixo dos 2%) e o mandato do Fed também cobre estimular a atividade. O outro lado disso é que provavelmente os juros reais vão ficar negativos por bastante tempo, o que também ajuda o Tesouro americano a lidar com a dívida; além disso, vai seguir sendo interessante para os bancos carregar dívida pública longa, desde que a inflação não se mexa muito nesse tempo. Intencionalmente ou não, os EUA entram de vez na era de financial repression.

- A Apple reportou o melhor trimestre de sua história - de que crise estamos falando? As ações já subiram mais que 10% este ano, o que reduz a probabilidade de eu acertar uma das minhas previsões irresponsáveis de 2012.

- Os juros de 10 anos na Itália chegaram a cair abaixo de 6% (já voltaram hoje, a 6,11%). Na Espanha, chegaram a operar abaixo de 5%. Sigo achando que uma linha foi traçada para a dívida européia: Grécia e Portugal podem ter que renegociar, mas a crise para por aí.

- O Banco Central do Brasil reafirmou a disposição em seguir cortando juros. Lembrem-se que das primeiras coisas que Dilma disse depois de eleita foi que ia tentar baixar os juros reais para 2%, estamos nesse caminho (ainda que promessas de políticos não possam exatamente ser tomadas ao pé da letra).

Esqueci de alguma coisa? De qualquer forma, acho que perdi pouca coisa e ganhei o privilégio de, pela primeira vez na vida, contemplar esta vista:


P.S. Parece que a festinha de começo de ano nos mercados está perdendo o gás. Hora dos búfalos recolherem os chifres.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Pequeno recesso

Vou me dedicar ao dolce far niente esta semana, dia 30 estou de volta.

Leituras da Semana

祝福大家新年快樂!!!

- 222 anos de juros longos nos EUA - já foram mais baixos do que agora, nos anos após a II Guerra.

- Discurso de Raghuram Rajan para a American Finance Association, defendendo a ligação entre Wall Street e Main Street e a importância de um mercado acionário vibrante.

- Will Hutton, de Oxford, recomenda cinco livros sobre justiça social e desigualdade (um do Rajan, entre eles).

- Música pop como indicador antecedente dos mercados (dica Balu, paper original aqui). Abordagem diferente do que o Robert Prechter costuma fazer.

- David Einhorn sobre 2011 e a crise, sempre relevante.

- Contra a austeridade fiscal em tempos de crise: Robert Shiller e Richard Koo.

- Lord Skidelsky provoca: dívida realmente importa?

- Alguém teve a paciência de contar as risadas nas reuniões do Fed para quais as transcrições estão disponíveis. Vai ficar interessante quando liberarem as de 2008.

- Ouvido no elevador da Goldman Sachs: matéria no FT e o twitter.

- Tentar imitar o "milagre" de desenvolvimento do Sudeste Asiático pode ser difícil. Falando em Ásia, o Japão, para minha surpresa, fechou 2011 com um déficit comercial, o primeiro desde 1963.

- A The Economist entrevista FHC.

- Eike para presidente, novo marco na sabujice do colunismo brasileiro.

- Vladimir Safatle sobre a Tunísia, primeira de uma série de visitas ao mundo árabe pós-revoluções.

- Existem leis fundamentais para cozinhar? Os quants invadem a cozinha.

- A solidão das Guianas, nossos vizinhos menos prestigiados.

- Pico Iyer sobre os benefícios de se desligar da vida digital.

- Frank Zappa como Jeff "The Dude" Lebowski e outros fantásticos elencos alternativos.

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Frase do dia - Tragédia dos Comuns

"Eu, que sou fã da economia de preços e de mercado, hoje percebo que ela padece de uma cegueira absurda, que é o modo como usamos os recursos ambientais."

Professor Eduardo Giannetti da Fonseca, em entrevista para o Valor de hoje. O conceito de tragédia dos comuns é de 1833 (quando observado pelo economista britânico William Forster Lloyd), e foi revisitado pelo ecologista americano Garrett Hardin, em trabalho de 1968.

Ah, o texto do André Lara Resende sobre os possíveis limites para o crescimento econômico, que saiu no mesmo caderno, também é bastante recomendável.

Som da Sexta - Elis Regina

Ontem fez 30 anos que perdemos uma de nossas maiores cantoras.

O negócio de gestão de dinheiro

Como se sabe, é das atividades com um dos maiores payoffs da nossa sociedade: para o gestor, o prejuízo é limitado a seu custo de oportunidade (quanto o mercado paga menos o que ele deixa de ganhar, se tiver desempenho ruim - há também um tema reputacional, não quantificável e muito discutível) e os ganhos são potencialmente enormes, com o uso implícito de alavancagem (o patrimônio para se montar uma gestora é, na maioria dos casos, muitas vezes menor do que os ativos administrados, sobre os quais são cobradas as taxas). Para Alice Schroeder, biógrafa de Warren Buffett, os dias de moleza estão acabando. Para Dogbert, continuam:


quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Escavando o legado de Tony Judt

A Amazon mandou um e-mail hoje falando do lançamento de um "novo livro" de Tony Judt, que faleceu em Agosto de 2010. Pelo o que entendi, o livro é um apanhado de conversas entre Judt e o também historiador Timothy Snyder, de Yale (autor de Terras Sangrentas, que o Mauricio Santoro resenhou esta semana). A conferir.


quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Distribuição de renda no Brasil, um pitaco

Dias atrás rolou uma discussão interessante (ainda que baseada em chutes e anedotas) nos comentários de um post sobre como São Paulo (e outras regiões do Brasil, imagino) tornou-se uma cidade muito cara e como a renda de parte dos habitantes não acompanhou essa mudança, implicando em queda no poder de consumo. Ontem o iconoclastas me mandou esse trecho de uma entrevista que o Marcelo Neri, da FGV-RJ, deu para a Carta Capital (dá pra ler a entrevista toda aqui):
CC: Os que ficaram para trás são da chamada classe média tradicional?
MN: Acho que sim, essa é uma boa classificação. Quem era classe média tradicional, perdeu. Acho que o Brasil dos últimos anos é o seguinte: boas e más notícias. A boa é que a desigualdade caiu. A má notícia é que a classe média tradicional não entrou na festa. O espetáculo do crescimento é só a preços populares, é um pouco isso. Não tenho essa visão de muita gente que diz que o Brasil entrou no século XXI. A gente está saindo do século XIX, é uma abolição da escravatura retardada. Está saindo de um país muito desigual muito rápido, mas recuperando um atraso grande.
 CC: O que explica isso?
 MN: Foi uma queda do retorno da educação. Por que a renda cresce na base da pirâmide? Pense no filho do peão. O pai dele era analfabeto ou analfabeto funcional. Ele foi lá, estudou, chegou ao ensino médio e não quer ser peão como o pai. Aí a demanda por pessoas pouco educadas aumentou muito. Tem mais gente com ensino médio, chegando ao ensino superior, com qualidade questionável da educação, é verdade, mas tem mais concorrência. Quem tem um diploma deixou de ser tão valorizado. E quem não tem diploma passou a ser valorizado porque são poucos, e tem muito trabalho braçal. Então tem o fator educação e o fator programas sociais. É o dinheiro para as pessoas lá na base, o Bolsa Família.
O Leonardo Monasterio deu três boas sugestões de leituras sobre esse mesmo tema ontem. Destaco a segunda, que mostra como o Gini do Brasil caiu muito pouco, e segue alto - pior ainda com a ressalva de que, até onde lembro, esse coeficiente não captura renda de capital, que, com a queda dos juros e valorização dos ativos nos últimos anos, deve ter crescido mais do que a renda do trabalho (quem realmente entende de desenvolvimento me corrija se falei alguma barbaridade, por favor). Se considerarmos que os mais ricos (talvez mais o 1% do que os 10%) não ficaram exatamente mal nesses últimos dez anos, uma conclusão possível é que a evolução da distribuição de renda no país no período pode ter sido algo perniciosa, com os mais pobres ganhado em detrimento da antiga classe média e aprofundando o buraco entre aqueles e os mais ricos. O bordão "classe média sofre" teria ganhado alguma substância, enfim.

Talvez seja cedo para chegar nesse tipo de conclusão, mas, se ela se provar correta, seria a hora de começar a se discutir publicamente os efeitos de segunda ordem de políticas que têm sido tão celebradas. Há mais de 2300 anos um tal Aristóteles disse:
A comunidade política mais perfeita é aquela em que a classe média está no controle, e é maior que ambas as outras classes.
E, pensando nas sociedades do mundo de hoje, isso parece não ter mudado tanto.

SOPA, PIPA, PQP...

Tudo o que você precisa saber sobre SOPA e PIPA, as duas propostas de legislação para, respectivamente, "combate à pirataria" e "proteção de propriedade intelectual" que estão tramitando no congresso americano (a primeira deve voltar a ser discutida em fevereiro; a segunda está agendada para ser votada na próxima terça-feira), está no GIF animado abaixo (cortesia do Oatmeal; odeio GIFs animados, mas a causa é boa):


Mais na Wikipedia, cuja versão em Inglês está bloqueada hoje, em protesto.

Como é a vida dos 1%

Últimos 3 Daily Dilbert:


terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Leituras da Semana

- Overdose de Guido Mantega na Época desta semana: capa, perfil (meio chapa-branca, achei) e entrevista. Não acrescentou muito ao que já se sabia dele.

- Uma defesa dos hedge funds, por Sebastian Mallaby. Seu livro sobre a história desse tipo de investimento (More Money Than God) é altamente recomendável.

- A entrevista de Persio Arida na Folha de ontem.

- Novas fronteiras do keynesianismo: bancos espanhóis tentam superar a crise imobiliária construindo mais.

- Dani Rodrik sobre o paradoxo de um mundo globalizado e a ausência de liderança supranacional.

- Ótimas entrevista e recomendação de livros de Peter Boettke, da George Mason University, sobre economia austríaca.

- Uma boa pergunta sem resposta (ainda que com cheiro de non sequitur): Why expect S&P, Moody’s, or Fitch to know it's junk when expert musicians can't tell a Stradivarius from a fiddle?

- A pergunta de 2012 do Edge: qual é sua explicação profunda, elegante ou bonita preferida? 192 grandes cabeças respondem. De economia & finanças, aparecem Richard Thaler, Eric Weinstein e Emanuel Derman.

- Previsões da Reuters para o ano. Use com moderação.

- O Fed da gélida Minneapolis entrevistou Esther Duflo. Trecho: "economics as a field generally is not very sympathetic to applied theory at the moment. I think theoretical work needs to be considered “hard core” to be interesting. That’s not specific to development economics; it’s a general issue in economics as a field."


- Economia como arte marcial.


- Quase um século antes da imagem da "lula-vampiro" (para falar da Goldman Sachs), o embrião do Fed era visto como um polvo-demônio.

- Muito interessante matéria na Newsweek sobre Obama e o valor de sua discrição.


- Mandelbrot aplicado ao Lego.


- 50 cartazes de propaganda soviética, com legendas traduzidas para o Português.

- Virando páginas do jornal com classe.

- Um comercial do Campari... dirigido por Federico Fellini.

- Fatos aleatórios do dia: "a survey by two economists, Roland Fryer and Steven Levitt, found that nearly 30% of black girls in California in the 1990s received a first name that they shared with no other baby born in the state in the same year. Back in 1954 a baby (later to become secretary of state) gained the one-off name Condoleezza because it sounded like a musical instruction to play “with sweetness”."

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Gráfico do dia - Brasil e China, 2002-2011

Pode escolher entre vantagens comparativas ou desindustrialização; por enquanto, não há como negar que a vida do brasileiro médio melhorou desde então.



Mais na última The Economist.

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Som da Sexta - Carla Bruni

Porque a França pode estar com problemas, mas tem a melhor primeira-dama do mundo. A letra é de Christina Rossetti, uma poetisa inglesa do século XIX.

Incerteza

Dilbert de hoje.


quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Frases do dia - argentinização

"The Treasury Department will be able to put into place accounting measures to keep the government from hitting the debt limit in the next few days, the White House official said. As a result, he said, there is no danger that the government’s creditworthiness will be affected."

De uma notícia do New York Times de 30 de Dezembro, destacada pelo Grant's. Frei Luca Pacioli deve ter dado uma boa espreguiçada no túmulo.

Gráfico do dia - corrida para o fundo (ou: virando japonês)

Nunca antes na história da humanidade foi tão barato para alguns governos financiarem suas dívidas (e, para provar que esse negócio de economia e mercados é esquisito, nunca o estoque de dívida foi tão grande - títulos públicos são bens de Giffen?). Este ano, partem de patamares muito parecidos EUA, Alemanha, Canadá e Reino Unido - créditos de qualidades e moedas muito distintas entre si. Outro fato interessante é que os juros na Suíça já são menores que no Japão - também dois países em situações bastante diferentes.


quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Leituras do começo de ano

- Já que está na moda criar novas doutrinas econômicas ou revisitar antigas (semana passada aprendi o que é chartalismo, por exemplo), com esta notícia fica oficialmente criado o drunkeynesianismo, que defende estímulos governamentais para produção e consumo de bebidas alcoólicas. Saúde!

- Paper novo (com ideias antigas) do Nassim Taleb, sobre limites da probabilidade. Seu novo livro, Antifragility, está quase pronto e sai ainda este ano pela Penguin.

- Gavyn Davies sobre as consequências da expansão dos balanços dos bancos centrais.

- Bob "The Bear" Janjuah continua... pessimista.

- Hungria: um texto anedótico que foi lido por 5% da população do país (obrigado, MK); um bom resumo da situação do país.

- Uma triste crônica de parte da academia econômica brasileira.

- Na Itália, a arte de ter uma Lamborghini declarando renda de 20 mil euros / ano.

- A série de textos do primeiro Estado do ano, com muita gente boa falando sobre a economia em 2012 (cortesia do Mansueto Almeida).

- Cinco livros sobre História Econômica.

- Moeda que vale para alguma coisa: uma das moedas de 50 pence comemorativas das Olimpíadas de Londres explica a regra do impedimento.

- Tyler Cowen tem uma nova conta no twitter para falar de comida (tema de seu próximo livro).

- 2011 foi o ano mais seguro da história da aviação.

- Uma defesa dos cursos de graduação em humanas, nos EUA.

- Como você colocaria um elefante numa geladeira? Perguntas pouco usuais feitas em entrevistas de emprego no ano passado.

- As belas capas dos livros da editora Civilização Brasileira, entre 1959 e 1970.

- Cartuns da campanha presidencial de F.D. Roosevelt, em 1933.

- A vida imita o The Onion.

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Breve nota sobre mercados neste início de ano

Quem acompanha este escriba no twitter possivelmente percebeu que comecei o ano mais otimista com os mercados (ou com "risco", como a imprensa tem gostado de chamar). Os motivos são os seguintes:

- Generalização do pessimismo no último trimestre do ano passado - todo comentarista econômico e mais seu cachorro resolveram alertar para o fim do euro, a insolvência dos PIIGS, o balanço dos bancos e o controle do Irã sobre o estreito de Hormuz. Regra # 9 do seu Bob Farrell.

- Mercados pararam de reagir a certas notícias pessimistas. Para pegar um caso, as ações do UniCredit, maior banco da Itália, já caíram mais de 40% este ano, e os índices dos principais mercados estão entre levemente negativos e positivos.

- Retomada da iniciativa dos governos. Fiquei com a impressão de que os governos e bancos centrais deixaram de ser reativos, e parecem agora antecipar minimamente a resolução (ou enrolação) dos problemas fundamentais. Ajuda também o fato de os EUA estarem em ano eleitoral: semana passada havia rumores de que Obama anunciaria um megaplano de renegociação de hipotecas; ainda que não seja exatamente essa a medida, é difícil acreditar que os incumbentes do poder não farão uso dessa vantagem e tentarão estimular a economia via política monetária e/ou fiscal. Também é ano de eleições presidenciais na França.

- Sazonalidade - mercados eficientes ou não, a história mostra que Janeiro é um bom mês para bolsas. Ver aqui.

- Fluxos - quando ouvir de algum analista de mercado que ações subiram ou caíram por "fluxos", desconfie, porque trata-se de uma explicação tautológica (ainda que correta): o mercado cai quando há mais vendedores que compradores e sobe na situação oposta. Feita a ressalva: o mercado parece sub-alocado em ações, e creio que vai ganhar força o tema de deslocar parte do dinheiro que era investido em governos (títulos públicos) para ações de empresas sólidas e boas pagadoras de dividendos.

O ambiente econômico, quase desnecessário dizer, segue ruim. Ocorre que conjuntura não dita a direção dos mercados, que, por natureza, tentam antecipá-la. Para resumir, muito pessimismo já está precificado, e talvez seja hora de uma certa correção. Nada que vá garantir um ano brilhante, mas talvez o suficiente para dispersar um pouco a manada de ursos que andou se formando.

P.S. Prestem muita atenção na Hungria.

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Sobre o IPCA 2011

Não queria falar do IPCA de Dezembro, divulgado hoje (0,5% no mês, acumulou 6,50% no ano, exatamente o teto da meta do BC), mas tem tanta gente perguntando que um post vai facilitar minha vida:

- A inflação é alta, claro. É inaceitável? Não sei. A alternativa ortodoxa seria ter levado os juros ano passado para, sei lá, 15%, e torcer pela eficácia do instrumento. Achei estranho que, nesse ambiente, o BC tenha cortado juros, mas o gradualismo ou a preferência por medidas alternativas às altas de juros me agradam. Na minha opinião, a grande pisada de bola foi dona Dilma não ter usado o tal capital político do primeiro ano de mandato para comandar uma blitz contra a indexação de contratos, tarifas, etc. O custo disso, creio, vão ser alguns anos de inflação mais alta do que poderia ser, mas, ao contrário de muita gente de opinião respeitável, não acredito num descontrole. Na dúvida, claro, é sempre bom ter parte da poupança em NTN-Bs.

- A outra discussão levantada pelo número redondinho é se o IBGE não teria, digamos, enfeitado o resultado para o BC ficar bem na foto e não ter que escrever cartinha explicando o estouro da meta (já não teria caso fosse 6,53%, foi o combinado; claro que 0,03% de inflação pra lá ou pra cá, na prática, fazem muito pouca diferença na vida do brasileiro).

Eu não gosto de teorias conspiratórias porque não são falsificáveis: toda evidência é a favor da teoria e toda evidência contra é prova da "conspiração" tentando esconder. Para pegar esse caso, reconheço que o IBGE não tem sido exatamente um exemplo de lisura (vide os meses de vazamento do índice no site antes do horário oficial de divulgação, troca de presidente) e que a região (América Latina) tem um histórico não muito bom de transparência com a inflação. Por outro lado, acho que a inflação do Brasil é das mais acompanhadas do mundo: tem divulgação de índice praticamente todo dia e, sem exagero, centenas de pessoas acompanham isso de muito perto na iniciativa privada (bancos, fundos, corretoras, consultorias, etc), com todo interesse em que de fato o índice reflita o comportamento dos preços (afinal, boa parte do estoque da dívida pública carregada por esses agentes é remunerado por esses índices). Enfim, reconheço a probabilidade (relativamente baixa, creio) do IBGE ter limado um pouco o número para não caracterizar o estouro da meta, mas não acredito em nenhum desvio realmente significativo da realidade. Quando e se isso acontecer, creio que seria rapidamente percebido.

- Alguém tinha perguntado nos comentários do post anterior: o estoque de NTN-B em poder do público é algo como R$ 450 bilhões; portanto, uma diferença de 1 ponto-base (0,01%) no IPCA tem impacto de R$ 45 milhões no custo para o Tesouro.

Som da Sexta - Caro Emerald

Comprei o disco dessa cantora holandesa apenas pela capa, no aeroporto de Amsterdã. Funciona muito bem para o nosso verão.

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Frase do dia - Moto contínuo

"Amazingly, Italian banks are now issuing state guaranteed paper to obtain funds from the European Central Bank (ECB) and then reinvesting the proceeds into Italian bonds, which is QE by any definition and near Ponzi by another."

Bill Gross, da PIMCO, em seu mais recente Investment Outlook, que saúda a chegada do mundo "paranormal" para os investimentos.

Criando incentivos para crianças

Via The Perry Bible Fellowship (a coletânea das tiras é brilhante, recomendo). Clique para aumentar.


P.S. Isso me lembra um texto que dizia que US$ 20 é o "suborno universal" (não estou achando o link). Será que ainda vale ou já inflacionou?

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Frases do dia - como anda a política (lá nos EUA)

Nowadays, a [Republican] candidate must believe not just some but all of the following things: that abortion should be illegal in all cases; that gay marriage must be banned even in states that want it; that the 12m illegal immigrants, even those who have lived in America for decades, must all be sent home; that the 46m people who lack health insurance have only themselves to blame; that global warming is a conspiracy; that any form of gun control is unconstitutional; that any form of tax increase must be vetoed, even if the increase is only the cancelling of an expensive and market-distorting perk; that Israel can do no wrong and the “so-called Palestinians”, to use Mr Gingrich’s term, can do no right; that the Environmental Protection Agency, the Department of Education and others whose names you do not have to remember should be abolished.

Da última The Economist. Ainda que exagerado, parece um bom pretexto para torcer pela releição do Obama; a conferir se vai ser esse mesmo o rumo. A charge também é de lá.

O Atlas de Complexidade Econômica

Por algum motivo, no final do ano passado deixei passar um dos trabalhos mais interessantes e criativos que já vi em economia: o Atlas de Complexidade Econômica, obra conjunta de Ricardo Hausmann (Harvard, Venezuelano), César A. Hidalgo (MIT, Chileno - América Latina dominando) e outros seis pesquisadores. O grupo tentou medir o nível de desenvolvimento dos países pelo nível de complexidade de suas relações econômicas (produzir e exportar maquinaria pesada, por exemplo, é mais complexo do que extrair e exportar ouro), tentando, com isso, estimar "a quantidade de conhecimento produtivo que cada país possui". Não vou entrar aqui em mais detalhes da metodologia, mas a quantidade de dados tratada é absolutamente impressionante, assim como o modo de apresentar os resultados. A "cara" da economia do Brasil, por exemplo, é esta:


Claro que uma interpretação mais refinada requer alguma familiarização com a notação usada; uma vez feito isso, não é difícil perceber padrões e identificar potenciais pontos fortes e fracos de cada país.

Os resultados ainda devem ser objeto de bastante estudo entre a turma do desenvolvimento, mas o trabalho original mostra várias correlações fortes entre o Índice de Complexidade Econômica calculado e diversas outras variáveis que indicam desenvolvimento (com os tradicionais problemas de econometria, claro, como o quê explica o quê). Curiosidade: o Brasil está entre os países cujo tal índice mais cresceu entre 1964 e 2008 - atrás de Maurício, alguns países do Sudeste Asiático (Tailândia, Malásia, Cingapura e Indonésia) e Uganda.

Para quem tiver um tempo e/ou interesse, recomendo uma boa olhada no site do projeto (que tem o trabalho em pdf e algumas visualizações interativas que permitem, por exemplo, visualizar como evoluíram no tempo as exportações de um determinado país). Para os preguiçosos ocupados, o Free Exchange fez um resumo do trabalho quando foi lançado.

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

JWT: 100 Things to Watch in 2012

Claro que em 100 chutes eles sempre vão acertar cinco ou seis, mas é divertido olhar tudo:

JWT: 100 Things to Watch in 2012

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Previsões aleatórias para 2012

Vai chutar...
No mesmo estilo do ano passado, aí vão os meus palpites para o que acho que vai acontecer neste ano. Como bem disse ontem o Ultimi Barbarorum, entre os participantes de mercado hoje em dia falta confiança em qualquer coisa, especialmente neles próprios. Não tenho como discordar, já que 2011 foi uma tragédia (no índice de acerto, não no que diz respeito à remuneração dos chutadores) para a maioria dos que dependem de previsões e, neste ano, os preços de mercado previstos por qualquer cenário podem divergir significativamente caso aconteça alguma ruptura na Europa ou em algum outro canto do mundo (problemas na China, guerra no Irã, etc). E, claro, para quem prevê cenários de ruptura, a não concretização deles é garantia de um rótulo de Cassandra, pelo menos por algum tempo. Enfim, vou tentar me concentrar no que acho que vai acontecer, não dependendo de cisnes de qualquer plumagem:

- Juros reais no Brasil vão seguir caindo. Investir em NTN-Bs seguirá sendo uma boa opção, o retorno deve superar o CDI por mais um ano.

- Juros das Treasuries americanas também cairão, fazendo novas mínimas históricas.

- Juros de 10 anos dos Estados Unidos, Canadá, Inglaterra e Alemanha começam 2012 mais ou menos nos mesmos níveis (entre 1,9% e 2,0%). Acredito em algumas apostas de divergência, comprando EUA e Canadá e vendendo os outros dois.

- Política monetária segue frouxa no mundo todo. E tome QE3 nos EUA, QEn no Reino Unido, algo parecido na Europa...

- O real vai seguir se depreciando contra o dólar americano, assim como o rand sul-africano, a lira turca, o peso mexicano e o forint húngaro.

- Reservas internacionais brasileiras não chegam aos US$ 400 bilhões. Chance não desprezível de começarem a cair. Comprar CDS do Brasil e México a um prêmio de 160 b.p. (50 b.p. mais baixo que o da França) parece uma boa aposta assimétrica.

- Sigo comprando bancos americanos, vendendo bancos europeus (o short selling está banido na maioria dos mercados na Europa, mas há como montar proxies disso).

- Se o crescimento da China ameaçar ir abaixo do esperado, o banco central voltará a desvalorizar o yuan. Acho o payoff dessa aposta muito bom, mesmo num cenário de crescimento inalterado, já que a maioria do mundo acha que o yuan só deveria se valorizar. Outra aposta muito boa em moedas é comprar coroa dinamarquesa contra euro, favorita do Cerebelo Econômico.

- Preços de imóveis nos EUA já fizeram a mínima; o índice Case-Shiller deve voltar a subir. Em São Paulo e no Rio, creio que estamos perto de uma inflexão. No melhor dos casos, acredito em altas até 10%, e o custo de oportunidade começaria a pesar.

- Ações para vender: Linkedin, Zynga, Groupon, Facebook (depois do IPO). No geral, negócios que dependem de muita fé em crescimento de fluxos de caixa futuros não irão bem (Grupo X?). Vou seguir apostando contra a Apple porque errei no ano passado (péssimo motivo, mas aqui passa).

- Agências de classificação de risco vão continuar o mergulho na direção da irrelevância. Venderia ações da Moody's, por princípio. Possivelmente sofrerão ameaças ou represálias dos governos que tiverem suas notas rebaixadas.

- Será bom comprar ações no Brasil, mas num preço pelo menos 10% mais baixo do que estão começando o ano. Ainda assim, melhor fazer o mínimo de stock picking do que comprar o índice, temo muito pela combinação de commodities + empresas picaretas que o compõe hoje. Para pegar um caso, bancos grandes devem ir melhor do que o índice. Empresas "parceiras" do BNDES, pior.

- Não gosto de Vale, vai ser dos shorts mais líquidos disponíveis no mercado quando o mundo se der conta de que a China pode, surpresa, não crescer perto de 10% ano após ano.

- Bancos médios vão seguir indo mal no Brasil. O modelo de negócios da maioria deles (captar caro no exterior e emprestar ainda mais caro aqui) parece estar se esgotando. O FGC deve ter trabalho.

- Não tenho grandes convicções em commodities, mas se fosse pra comprar algo, seria petróleo.Agrícolas têm cara de que ainda podem cair muito.

- Creio que hedge funds terão outro ano para ser esquecido, com mercados de ações sem tendência e intervenções cada vez maiores dos governos.

- Ainda há alguma intenção de concluir a Rodada de Doha, da OMC? Se há, vai falhar.

- São Paulo vai eleger um prefeito de ruim a muito ruim.

- Metade das participantes do Big Brother farão capas da Playboy e/ou Sexy.

- Meryl Streep será, de novo, indicada para um Oscar (dããã).

- O Corinthians finalmente vence a Libertadores (PAREM DE RIR!). Lusa se segura na série A.

- Usain Bolt perde os 100m rasos, mas leva os 200m em Londres. Brasil fará novo fiasco, no futebol masculino e no geral.

- Os filmes argentinos continuarão (muito) melhores que os brasileiros.

- O megahit Ai Se Eu Te Pego será regravado em Espanhol, Italiano, Romeno, Swahili, Esperanto e Cantonês.

- O mundo não vai acabar em 21 de Dezembro. Lá pra Novembro eu publico a nova data.

- Vou errar mais previsões do que no ano passado.

O leitor mais atento vai notar que não fiz previsões para nenhuma das questões que realmente vão definir o ano: sobrevivência do euro, possibilidade de hard landing na China; eleições na França, EUA, Madagascar e outros países relevantes; ataques de Israel ao Irã; e por aí vai. Para alguns desses eventos, não tenho a menor ideia do desfecho (não que tenha muita para os previstos); para outros, creio que as probabilidades são balanceadas. Resta manter a humildade, apegar-se aos fatos e mudar a cabeça conforme eles aparecerem. Essa dica de investimento é mais valiosa que qualquer uma das barbaridades que listei acima.

Outras boas listas de (anti) previsões para o ano:

- Bristlemouth: 10 Stock Market Predictions for 2012

- Abnormal Returns: 5 reasons to ignore top 10 stock lists

- Saxo Bank: Outrageous Predictions 2012

- The Economist

- globo.com 2012

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Olá, 2012

Estou de volta, ainda meio devagar. Logo coloco minhas previsões para o ano e sigo com a rotina. Um grande começo de ano a todos nós.