segunda-feira, 21 de maio de 2012

Supersimplificando a crise

Esse modelinho me ocorreu semana passada, fruto das muitas horas gastas lendo e tentando entender a crise da Europa (e, em menor medida, dos EUA - sigo achando que o país está muito mais adiantado no ciclo de desalavancagem e liquidação). Deve ter várias simplificações grosseiras, mas tem me ajudado a colocar o imenso fluxo de notícias e ruído em perspectiva; talvez também sirva para algum leitor:


Governos não querem desagradar os plutocratas, seja porque foram eleitos com ajuda deles ou porque não têm incentivos para isso. Daí parte que todas as soluções pensadas para a crise são acomodativas e não atacam o status quo, partindo do princípio que bancos precisam ser salvos a quase qualquer custo (a quebra da Lehman é vista como o principal erro de política econômica dos últimos anos) e que o dinheiro investido nesses salvamentos fluirá para o resto da economia (ainda há grande confiança em "trickle-down economics", um dos zumbis do livro do John Quiggin). Líderes políticos não têm vontade ou legitimidade para tomar ações de real impacto, e quase toda a ação fica concentrada em bancos centrais, que gozam de certa discricionariedade mas têm apenas uma ferramenta (ou variações dela) e são submetidos aos mesmos interesses dos políticos. Essas ações têm efeito temporário; quando deixam de ter efeito, são renovadas com incrementos às mesmas ações.

Aos eleitores insatisfeitos, resta, sabendo que os partidos moderados à esquerda e à direita são muito semelhantes entre si, tentar alternativas radicais e/ou populistas. Há duas possibilidades para o ciclo ser quebrado, ambas dependendo de ação da população: primeira, quando uma dessas alternativas for eleita com uma plataforma de profundas mudanças, não necessariamente boas ou racionais (talvez seja o que está acontecendo na Grécia, ainda que a maioria não veja o euro como problema). Segunda, com uma corrida bancária, que força ação imediata sob pena de total desestabilização no sistema e caos financeiro. Semana passada, aparentemente, estivemos perto disso, mas, por algum motivo que não compreendo, o movimento de manada não se acelerou. Em qualquer dos casos, fica (mais) evidente o equívoco da tese do "fim da história" e uma renovação da importância da política.

10 comentários:

Anônimo disse...

Tem algo mais: a divergência nos propagadores da teoria econômica em como enfrentar a crise. Austeridade ou gastança? Como já foi dito, os políticos estão na mesma posição quando dos debates sobre o padrão ouro, antes da 2°GG e depois. Falta teoria.
O lado bom é que a austeridade como único remédio perde um pouco da força, mas a turma do free-lunch keyneisano, ao que parece, não terá tempo de ganhar a discussão na Alemanha antes que o mercado entre em colapso. O abraço do afogado é a profecia autorealizável do Euro.
Fernnado A.

Jorge Browne disse...

DK, impossível não concordar contigo. Quando a política do mainstream não parece resolver mais é natural que as pessoas busquem soluções nos extremos.

Entretanto, acho que nas democracias os políticos tem legitimidade sim, podem não ter vontade mas, fundamentalmente, não tem é poder para peitar a plutocracia. A hegemonia (a la Gramsci) do sistema financeiro é inconteste.

Por fim, o que são alternativas populistas? Termo em voga esses dias mas que carece de definição.

Drunkeynesian disse...

Legitimidade, uns têm mais que os outros: Mario Monti tem pouca, por exemplo, e ainda faltam alguns governos caírem.

Boa pergunta. O mundo anda tão maluco que fica difícil caracterizar o que é populista. Há pouco tempo, nada soaria mais populista que monetizar dívida, mas isso virou mainstream. No caso dos países do euro, uma face do populismo deve ser vender a saída do euro como alternativa inequivocamente boa; um lado mais negro seria um aumento do nacionalismo, começar a botar a culpa da crise em imigrantes, etc...

Dawran Numida disse...

Boa pergunta.
Mas, populista parece ser quem propõe uma lei para que sejam flexionados os designativos de profissões, cargos, em diplomas etc.

Agora mesmo, foi aprovada e sancionada uma aqui no Brasil.

Ou seja, bacharel, se for mulher, será bacharela.

E flexionando, populistas seriam todos os que apoiam e elogiam a nova lei.

E populismo, então, seria a proposição de leis inócuas, para não utilizar um termo popular, como essa.

Passando tudo isso para a economia, daria para perceber muito bem o que seria populista e populismo.

Drunkeynesian disse...

Enquanto for inócuo assim...

Jorge Browne disse...

Se tivesse acabado minha tese teria defendido que o populismo econômico enquanto categoria analítica não existe.
Populista acaba sendo o outro, algo com que a gente não concorda.
Na origem brasileira o populismo foi um pejorativo dado ao trabalhismo.

Delfim Bisnetto disse...

Se o Browne aceita um palpite na sua campanha contra a categoria do "populismo", eu diria que "populista" refere-se mais precisamente a estilos discursivos e não a práticas de política.

Por exemplo, usar os bancos públicos para baixar os juros é uma tentativa que pode ser considerada boa ou ruim, adequada ou não, mas não populista. Dizer que isso é uma "cruzada contra a ganância dos bancos privados" é populismo.

Drunkeynesian disse...

A Argentina parece um caso evidente de populismo, mas, de novo, depende da percepção do que alguém acha certou ou errado em política econômica (ou que produz resultados bons ou ruins). Eu acho que o caso deles vai ficar evidente (se já não está) que é ruim, mas posso estar errado.

Jorge G L disse...

Pelo contrario, a tese do "Fim da Historia"-- de que o mundo caminha, num processo historico dialetico, rumo a sintese democratica liberal, estah mais viva do que nunca. Vide eventos do Oriente Medio e China, que sinalizam a insustentabilidade, no longo prazo, de regimes autoritarios.

Drunkeynesian disse...

O que não quer dizer que regimes autoritários desemboquem em democracias liberais, vide o que está acontecendo no Egito.