terça-feira, 30 de novembro de 2010

Quando o liberalismo econômico vira religião...

... seus seguidores acabam atropelando a realidade, e o colocam na mesma categoria de outras crenças que são levadas menos a sério (e que têm defensores mais expressivos, convenhamos).

Rodrigo Constantino, em dezembro de 2007 (notado pela Carta Capital desta semana):

"O caso da Irlanda vem bem a calhar então, pois se trata de um impressionante exemplo do sucesso das reformas liberais, que reduzem a intervenção estatal e aumentam a autonomia individual. A Irlanda aderiu com vontade ao capitalismo global, e isso permitiu um enorme crescimento econômico, levando a renda per capita dos irlandeses para patamares espantosos. O país, que era um dos mais pobres da Europa, mereceu o título de “tigre celta”. Não há milagre por trás deste sucesso, apenas lógica e respeito aos fatos da realidade."

E hoje:

"... o sistema bancário expandiu o crédito sem limites, colocando todas as conquistas em risco. Alguns oportunistas de esquerda aproveitam para atacar... as reformas liberais, como se estas fossem causa dos problemas. Não são! São o motivo do relativo sucesso, que mesmo após esta crise toda, gerada pelos bancos e pela bolha imobiliária mundial, ainda mantém a Irlanda como uma nação próspera."

E o sistema bancário "expandiu o crédito sem limites" por falta ou excesso de regulação / supervisão / liberalismo? Será que algum irlandês médio, vendo a taxa de desemprego sair, em pouco mais de três anos, de 4,8% para 13,6% (o maior desde 1994) e a possibilidade de um ajuste nominal brutal, considera sua nação próspera? Não é preciso ser nenhum oportunista de esquerda para achar respostas para essas perguntas que façam com que as tais reformas liberais pareçam algo sensivelmente pior que um sucesso inequívoco.

When the facts change, I change my mind. What do you do, sir?

Uma crítica do afrouxamento quantitativo (QE2)

Do ótimo economista da Nomura, Richard Koo. Responde com muito mais propriedade uma dúvida que o Igor colocou em um post passado. O João Marcus também deve gostar.

Richard Koo: growing criticism of QE2 and its implications

Vídeo do dia - Hans Rosling na BBC Four

O sotaque e o otimismo continuam os mesmos... mas a apresentação dos dados:



Via The Big Picture.

Frase do dia - Espanha

"History is kind to Spain. They were the first nation ever to default. King Philip II of Spain came to the throne in 1556, defaulted on Spanish Debt in 1557, 1560, 1575, 1596 and then died in 1598."
De um gestor de fundos anônimo que estudou História.

Em tempo:


O primeiro 5-0 a gente nunca esquece, né, Mourinho?

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Vídeo do dia - Educação

Algumas provocações muito interessantes:

O Panamericano e a credibilidade do Copom

Na semana passada, seu Meirelles andou falando que o BC já sabia do problema do Banco Panamericano desde julho (ver no Estado), e que tal informação pesou nas decisões de política monetária desde aquela época. O curioso foi ninguém ter estranhado essa informação vinda do presidente de uma entidade que vive dizendo ter compromisso com a transparência, e que, após manter os juros básicos inalterados em setembro (contra o que boa parte do mercado esperava), citou como justificativa "a redução de riscos para o cenário inflacionário".

A impressão que ficou para quem esteve nas reuniões com Meirelles na semana passada (boa parte dos economistas de bancos, corretoras e fundos de investimento de São Paulo; há um vídeo no site do BC que para mim não funcionou, talvez o leitor tenha melhor sorte.) é que, caso não houvesse a história do Panamericano, os juros não teriam parado de subir. Se isso é verdade, o Copom não só omitiu a informação que tinha de que havia um banco com problemas como mentiu na justificativa para sua decisão de juros. A transparência, no caso, é de acordo com a conveniência. E ainda há quem leia as atas do Copom e use a informação que está lá como guia para tomada de decisões no mercado...

Capitalismo com características brasileiras

Da coluna do Elio Gaspari de ontem, sobre um livro que vai merecer ser lido:

QUAIS DAS seguintes informações são comprovadamente falsas:
1) A privataria iniciada em 1990 vendeu 165 empresas públicas, gerou uma receita de US$ 87 bilhões e reduziu a presença do Estado na economia nacional.
2) A expansão do setor privado sobre a mineração, telecomunicações, portos, rodovias e no setor elétrico colocou mais competidores no mercado.
3) Antes da chegada dos europeus houve na Amazônia uma civilização fundada por extraterrestres.
Seis anos de pesquisas, durante os quais o professor Sérgio Lazzarini, do Insper, mastigou 20 mil dados estatísticos de 804 empresas, informam que as duas primeiras afirmações são comprovadamente falsas. Quanto aos ETs da Amazônia, quem quiser pode continuar acreditando.
Entre 1996 e 2009 a rede do Estado e dos burocratas de caixas de pensão da Viúva expandiu-se. Cruzando-se números do banco de dados de Lazzarini descobre-se que, em 1996, num universo de 516 grandes empresas, o BNDES e os fundos Previ (Banco do Brasil), Petros (Petrobras) e Funcef (Caixa) participavam de 72 sociedades. Em 2003, numa amostra de 494 companhias a Boa Senhora estava em 95. Em 2009, num universo de 624, o Estado tinha um pé em 119 empresas.
O trabalho do professor chegará nas próximas semanas às livrarias, com o título de "Capitalismo de Laços". Além de mastigar números, Lazzarini foi fundo na documentação do assunto e nos estudos sobre as conexões do mundo empresarial. O livro tem 184 páginas, 51 das quais ocupadas por notas, descrições metodológicas e pela bibliografia.
"Capitalismo de Laços" começa recontando a investida recente do Palácio do Planalto, do fundo de pensão Previ e do empresário Eike Batista sobre os administradores da Vale. Em tese, a Vale é uma empresa privada. Na prática, pelos "laços", o governo é seu maior acionista e, na ocasião, Batista era o melhor amigo.
Segundo a revista "Forbes", ele é o homem mais rico do Brasil. Em 2008, foi o maior patrocinador privado do filme "Lula, o Filho do Brasil" e, em 2006, o maior doador individual na campanha que reelegeu Nosso Guia. Quem teria sido o maior doador corporativo? A Vale.
A privatização virou privataria (termo que Lazzarini não endossa), quando o tucanato, em busca de recursos e de interessados para os leilões de venda do patrimônio da Viúva, recorreu às arcas dos fundos de pensão e do BNDES. Diz o professor: "Fernando Henrique, longe de "esquecer o que escreveu", em realidade ajudou a sedimentar o capitalismo de laços no Brasil". Durante os últimos oito anos petistas alguns laços desfizeram-se (os de Daniel Dantas, por exemplo), outros, como os de Eike Batista e do grupo JBS-FriBoi (outro grande doador de 2006), estabeleceram-se.
Os laços do andar de cima com o Estado foram magistralmente mostrados por Raymundo Faoro em seu "Donos do Poder", um livro de 1957. Lazzarini poderia ter chamado seu livro de "Donos do Poder 2.0". Ele fulanizou e quantificou suas afirmações. Estudou a composição acionária das empresas do seu banco de dados para testar uma variante do famoso "diga-me com quem andas e eu te direi quem és": "Diga-me de qual empresa você é dono que te direi quem é o seu amigo".
O professor trabalhou com um complicado conceito de "centralidade". Simplificando-o quase ao exagero, é como se tivesse estudado a composição acionária das empresas com o olhar de um usuário do Facebook. Em 1996, quem tinha mais "amigos" eram a União (com o BNDES) e a Previ. Em 2009 a situação era a mesma. Com outro critério, olhando-se para os grupos econômicos e seus cruzamentos, hoje quem tem mais amigos é o conglomerado da Andrade Gutierrez, seguido pelo grupo do empresário Carlos Jereissati.
Estudando a estrutura das grandes empresas, Lazzarini mostra como é pequeno o mundo dos amigos entrelaçados: 11 grão-senhores participam de 66 conselhos de empresas.
Na epígrafe do livro o professor repete a frase do romance "O Leopardo", quando o aventuroso Tancredi (Alain Delon no filme) diz ao tio (Burt Lancaster): "Se quisermos que tudo fique como está, é preciso que tudo mude".

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Gráfico do dia - dívida para bancos alemães

A história da dívida da Europa assemelha-se a um jogo de mico... com pelo menos cinco micos no baralho (e não mais que dez pessoas jogando).


Via The Big Picture.

Som da Sexta - Paul McCartney

Esta semana não poderia ser diferente. Thank you, Sir Paul.

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Leituras do Thanksgiving Day

- A bolsa do México segue movida a tequila. A ressaca promete. (Andrew Shawn)
- O governo americano está fazendo pouco para estimular a economia. Medo. (Brad DeLong)
- O Brasil é o rei do crescimento nas importações, entre 70 países cobertos pela OECD. (FT beyondbrics)
- O tamanho da besteira no sistema bancário irlandês (Planet Money)

Um sonzinho apropriado para o dia:

Gráficos do dia - Irlanda: caindo do céu

Ah, o "tigre celta". A Irlanda é era o caso de maior sucesso de adoção do euro. Seus 4,5 milhões de habitantes viram, em quinze anos, seu PIB per capita mais que dobrar, passando a ser o terceiro maior da zona do euro (atrás de Holanda e Áustria) e um dos 30 maiores do mundo (veja aqui). Milagres da alavancagem: hoje, como a Islândia há um par de anos (será que há um padrão de nomes começados com "I"? Cuidado, Itália), o país está com o sistema bancário quebrado e prestes a aceitar uma ajuda internacional de cerca de US$ 25 mil por habitante (US$ 114 bilhões), que, sinto informar, não vai resolver todos os problemas. O ajuste deve ser longo e doloroso.

Para ilustrar o tamanho da distorção, comparei a evolução do PIB per capita da Irlanda com o de outros quatro países europeus notadamente ricos: Suécia, Noruega, Dinamarca e Suíça (os dados são do FMI):


É notável a aceleração do crescimento da Irlanda por volta de 1998, quando a libra irlandesa entrou na composição do euro. Em 2007, antes da crise global, o PIB per capita da Irlanda era de US$ 43,250, apenas menor, na nossa amostra, que o da Noruega - este um real caso de sucesso, ajudado pelo petróleo, sim, mas com baixíssima alavancagem. O delírio era acreditar que, em uma geração, uma economia relativamente atrasada teria desenvolvido uma fórmula que a equipararia com alguns dos países mais avançados do mundo. Atualmente os números ainda dizem que o cidadão irlandês ainda é mais rico que os dinamarqueses e suecos, mas isso pode ser explicado em grande parte por uma taxa de câmbio artificialmente valorizada - e o ajuste ainda está por vir. O gráfico abaixo mostra os mesmos dados em uma outra apresentação:


A linha azul é a razão entre o PIB per capita da Irlanda e a média dos outros quatro países. Em 1989, o PIB per capita da Irlanda era pouco mais do que a metade da média da nossa amostra. Em quinze anos a Irlanda alcançou essa média, chegando a superá-la por pouco tempo. Nesse período longo (quase 30 anos), o PIB per capita irlandês foi 75% da média dos outros quatro países. O último dado está em 95%, e, como disse, o ajuste ainda está acontecendo. Caso essa relação volte para o padrão de longo prazo, o PIB per capita da Irlanda deveria cair mais 20%, chegando a US$ 31 mil. Talvez esse cenário seja muito pessimista (e pode ser concretizado apenas com adoção de uma taxa de câmbio mais realista, que, como no caso da Grécia, me parece ser a saída menos destrutiva para a economia), mas o fato é que os irlandeses têm bons motivos para seguirem pedindo que St Patrick perdoe os excessos dos últimos anos.

Mapa do dia - Tamanho x população

Roubado do Gian (clique para aumentar):

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Panamericano e Caixa

E a velha dúvida entre ignorância e má fé continua no ar...

Do UOL:

Presidente da Caixa diz que rombo bilionário do Panamericano não causa perdas

Destaque:

"A Caixa não considera que perdeu. Ela não comprou a instituição como especuladora, para comprar na baixa e vender na alta. Comprou com base em planejamento interno, temos a segurança de que a implantação do plano de negócios vai resolver a situação".

Plano de negócios mais uma injeçãozinha de capital, caso o Panamericano precise. Mas o contribuinte pode ficar tranquilo, tudo isso estava previsto nas "melhores práticas" que avaliaram a operação.

Gráfico do dia - América Latina e países avançados

Mais uma vez os dados dando um baile de humildade neste escriba (e, talvez, alguma razão para o Bresser-Pereira). A Argentina, durante a última década, é o maior caso de sucesso no continente em aumento no PIB per capita / redução da diferença dessa mesma medida para os países ricos.



Via IKN.

Fumaça branca no Banco Central

A melhor parte do anúncio de Alexandre Tombini (a ser feito hoje, segundo toda a imprensa) como novo presidente do Banco Central do Brasil foi termos escapado de aguentar o Octavio de Barros no cargo.

Maldades à parte: alguém precisa de mais algum sinal de que a política econômica de dona Dilma, pelo menos no início do governo, será muito parecida com a do Lula, para o bem e o mal?

Update: acabou de sair que Luciano Coutinho foi convidado a continuar no BNDES. Change, we can't believe in.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

A tentação de fazer previsões

Nem quem vive dizendo que elas são inúteis nos melhores casos e danosas nos piores consegue escapar dela (na The Economist).

Tchau, Meirelles

Uma das melhores piadas do mercado financeiro é que você deve comprar profissionais argentinos pelo que eles valem e vendê-los pelo que eles acham que valem (se você achar esta ruim, não queira saber do nível médio das gracinhas do meio). Henrique Meirelles, nesse sentido, é um argentino: chegou para mostrar que  Lula tinha virado amiguinho do mercado financeiro, escapou por pouco de ser sacado no meio do caminho (Luiz Gonzaga Belluzzo chegou a ser convidado por Lula, em 2008, e recusou) e depois surfou no sucesso relativo do país. Virou "peça fundamental", "fiador da estabilidade" e outros títulos ridículos. Passou a ser referência entre banqueiros centrais, mesmo não podendo esconder que subiu os juros básicos praticamente na véspera da quebra da Lehman Brothers, quando a economia mundial estava na beira do abismo (isso diz bastante sobre a crise intelectual em que anda a classe). Mostrou-se um desastre em articulação política, tentando enfiar goela abaixo das raposas do PMDB uma candidatura ao governo de Goiás ou à vice-presidência. A não ser que seu substituto seja um desastre (bem, há o risco... dos quatro nomes que a imprensa andou citando, dois são banqueiros, um é ainda mais "argentino" que Meirelles e a opção que parece menos pior é um burocrata de carreira), não vai deixar muitas saudades. Novamente, se a imprensa estiver correta, vai ter uma grande oportunidade de mostrar serviço no Ministério dos Transportes. "O Banco Central não é a Santa Sé", disse Serra durante a campanha. Dilma está reconhecendo isso, e por enquanto não há nada que aponte que ela está errada.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

(Mais uma) Frase do dia - Bebe, Brasil!

Esta não podia faltar num blog drunkeynesiano:

"A cachaça não está acompanhando a expansão da economia porque o consumidor quer ficar chique", diz César Rosa, diretor do Instituto Brasileiro da Cachaça (Ibrac) e da Indústria Reunidas de Bebidas Tatuzinho, fabricante da cachaça popular Tatuzinho e da Velho Barreiro.

Mais no ValorClasses C e D substituem cachaça por vodca e uísque.

Frase & notícia do dia - Eric Cantona

"When the seagulls follow the trawler, it is because they think sardines will be thrown into the sea."
1995

Quinze anos depois... ele está organizando uma campanha para causar uma corrida contra os bancos na Europa. Mais aqui.

domingo, 21 de novembro de 2010

Frase(s) do dia - O que os mercados querem?

Os mercados querem dinheiro para cocaína e prostitutas. Sério. A maioria das pessoas não percebe que 'os mercados' são na realidade recém-formados em administração de 22 a 27 anos, que inventam furiosamente estratégias de compra e venda em planilhas Excel, se reportam a chefes cinco anos mais velhos e, geralmente, têm a mentalidade e inteligência de ginasianos. Um plano orçamentário de quatro anos não vai deixá-los satisfeitos. Daqui a quatro anos estarão fora do negócio ou promovidos a uma posição na qual a Irlanda não lhes importará mais. Em vez de um orçamento apropriado, o que o país pode fazer é subornar as agências de classificação de risco. Pão e circo para as massas, cocaína e prostitutas para o mercado. Por que não explorar o fato de que o sistema é caótico e aético para fazer algum bem ao país em vez de levá-lo à falência num esforço para comprar BMWs novos para solteiros de 25 anos?
Resposta anônima à pergunta do título (colocada pelo economista irlandês Kevin O'Rourke em seu blog), citada na CartaCapital desta semana.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Som da Sexta - Maxïmo Park ao vivo no táxi

O projeto Black Cab Sessions começou em maio de 2007, e consiste em gravar uma música de uma banda durante um passeio em um dos famosos táxis pretos de Londres. Este é o episódio com a Maxïmo Park, no site você vê dezenas de outros.


Maximo Park from Black Cab Sessions on Vimeo.

Frase(s) do dia - Religião & Evolução

Da seção de perguntas e respostas da última Superinteressante (sim, de vez em quando eu leio Superinteressante):

P: É coerente acreditar em Deus e também em Darwin?
R: Posto que o refeitório aqui da Abril serve uma sobremesa chamada "minibrigadeirão light", qualquer coisa pode ser coerente.

Bom, hoje eu não estou muito pra coisa séria (deve ser influência da confirmação do Mantega na Fazenda... isso também não pode ser sério). Em todo caso, para os que estão aqui para ouvir de economia e mercados, o Mansueto Almeida postou um texto muito bom falando da experiência da Itália com a construção do trem bala, recomendo fortemente.

Imagem do dia - Austeridade

Cartoon da The Economist desta semana:

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Duas leituras sobre desenvolvimento

- Nicholas Kristof, do New York Times, sobre o aumento da desigualdade nos EUA (quem diria, há cinco anos, que essa discussão ia parar no New York Times tão rapidamente).

- William Easterly confessa que ainda não concluiu se ajuda para países pobres faz mal ou bem. A humildade para concluir isso depois de 25 anos estudando o assunto infelizmente não é tão difundida na academia.

A consagração da mediocridade

Da Folha:

Dilma convida Mantega a permanecer na Fazenda

Vamos ver como a tartaruga que foi parar em cima do poste se sai nesse mundo mais complicado.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Gráfico do dia - Preços de Imóveis

Como achar que preços de imóveis em São Paulo ainda são baratos: veja o gráfico abaixo, de um relatório da Nomura.



P.S. Considerando o tamanho e a distribuição de renda da cidade, a dispersão dos preços entre as regiões de São Paulo deve ser das maiores da amostra.

Um zumbi se levanta

Hoje acontece a venda de ações da General Motors, sepultada em 2009 e ressuscitada com o dinheiro do tesouro americano.

Da Bloomberg:
An overallotment and an offering of preferred shares may increase the total amount raised to about $22.7 billion. Agricultural Bank of China Ltd.’s $22.1 billion initial sale is the largest common-stock IPO in history.
E o gran finale:

The Treasury, which is taking a loss on its portion of the sale, will break even only if the shares climb at least 60 percent, Bloomberg data shows.

Isso faz o escândalo do Banco Panamericano parecer coisa de amadores...

Dados do dia - gastos militares

Numa matéria da The Economist desta semana sobre o futuro da OTAN, uma tabela me chamou a atenção:



O porquê da Grécia ter um gasto militar só comparável ao dos EUA deve ser uma das explicações para o tamanho do buraco onde o país se enfiou nos últimos anos.

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Bernanke, a Geni do momento

Consideremos o vídeo abaixo, que um leitor postou como comentário hoje (esses bichinhos do xtranormal estão virando um clássico):



Daqui a pouco vão comparar Bernanke a Hitler, e a discussão estará perdida.

Brincadeiras à parte: o vídeo é uma amostra de como a popularidade de Bernanke está indo ralo abaixo, com a economia não reagindo a todo o estímulo monetário e os bancos voltando à festa como se fosse 2007. Não ajuda o fato de os mercados não estarem seguindo o script imaginado por Bernanke quando foi anunciado o QE2: os juros longos subiram consideravelmente, o dólar se valorizou e as ações têm falhado na tentativa de fazer novas máximas.

Se os mercados seguirem a direção dos últimos dias, vejo dois cenários interessantes que podem se desenrolar (a tentação de fazer previsões é enorme):

1) O Fed não vai fazer mais nada, os políticos e a população vão pedir a cabeça de Bernanke e ela será entregue. Resta saber o que vem depois: um clone de Bernanke ou a volta triunfal do Paul Volcker (medo).

2) O Fed não vai se entregar sem lutar, e devemos esperar (mais) medidas (mais) desesperadas para tentar levantar os mercados e baixar os juros longos na porrada.

A maldição dos interesting times parece mesmo estar sobre os nossos tempos.

Brincando de EUA

O New York Times montou uma ferramenta para resolver o déficit americano (de médio e longo prazo), envolvendo combinações de cortes no orçamento e aumento de impostos. A minha solução está aqui. É impressionante verificar o estrago que a dupla cortes de impostos / aumento nos gastos militares da era Bush fez nas contas públicas dos EUA. E como é fácil pensar em soluções quando não há políticos e grupos de interesse envolvidos.

Gráfico do dia - Velocidade de conexão na internet

Mas tudo vai se resolver com a volta da Telebras, não se preocupem.

Via Inka Kola News.

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Som da Sexta - Belle & Sebastian, Norah Jones

Eles tocaram na última quinta-feira, no Via Funchal (a imprensa toda falou que o show foi morno comparado ao do Free Jazz de 2001, eu só fui este ano e achei ótimo) e hoje estarão no Rio; ela se apresenta no domingo às 16h no Parque da Independência. Juntos fizeram Little Lou, Ugly Jack, Prophet John, que está no último álbum do Belle & Sebastian (Write About Love), lançado no mês passado. Eu tenho um fraco por duos cantor / cantora desde ouvir Gram Parsons com Emmylou Harris, e esta colaboração pode tranquilamente entrar na mesma liga -- ela está cantando cada vez melhor.



Os 12 Trabalhos de Dilma (parte 3 de 3)

Os 12 Trabalhos de Dilma (parte 1 de 3)
Os 12 Trabalhos de Dilma (parte 2 de 3)



9 - Lidar com possíveis efeitos de estouro de bolhas

Já escrevi aqui que o Fed está fazendo de tudo para incentivar a criação de bolhas. Se isso de fato se concretizar, é bastante provável que alguma(s) delas estourem durante o mandato de dona Dilma. As políticas anticíclicas adotadas pelo Brasil depois da crise de 2007/2008 foram bastante efetivas, e este exemplo deve servir para o futuro.

(Na verdade eu listei este tópico pensando nos preços de imóveis em algumas cidades do Brasil, mas, como escrevi esta semana, é muito difícil pensar em bolha enquanto trabalhamos com juros acima de 10% ao ano. Quem sabe no próximo mandato.)

10 - Pré-sal

Também já escrevi bastante sobre o pré-sal aqui. A aposta do Brasil no petróleo não é um all in, mas está longe de ser segura. Algo como ter dois valetes na mão antes da virada do flop: parece muito promissor, mas pode muito bem não ser ganhador (e até terminar em desastre, dependendo da sorte). Além das incertezas naturais de um projeto de exploração de commodity, a Petrobras vai ter que controlar os pequenos interesses que aparecem quando uma empresa estatal tem R$ 150 bilhões para gastar. Ah, o vice-presidente é do PMDB.

11 - Infraestrutura

Este tema é tão batido que dá preguiça de escrever a respeito. Estradas, portos, aeroportos, ferrovias, estádios para a Copa... tudo a ser construído, (quase) tudo tem um potencial altamente positivo para o país (de empregos à melhora no bem estar e aumento do crescimento potencial, competitividade, etc), e, ainda assim, estamos há anos adiando os investimentos. Dilma vai precisar fazer mais do que anunciar sequências do PAC e inaugurar remendos da BR-101.

12 - Não cair na tentação do populismo quando as coisas não andarem bem

Um teste básico para saber se determinada atividade tem o acaso como fator preponderante é se perguntar se, deliberadamente, é possível conseguir o efeito contrário da intenção inicial. É impossível perder de propósito um jogo de roleta (100% acaso), mas é relativamente fácil entregar todas as fichas numa mesa de pôquer ou manipular o resultado de um jogo de futebol (o leitor pode pensar a respeito do mercado financeiro: a resposta intuitiva diria que eu poderia ser trocado por um chimpanzé jogando uma moeda para o alto no meu trabalho -- o que não é uma visão exatamente errada em parte do tempo). Em política econômica, as políticas "corretas" não garantem sucesso, mas a história está cheia de exemplos de economias que foram para o buraco quase exclusivamente por decisões de seus líderes -- a Venezuela atual é o exemplo mais fresco, e pelo caminho ficaram Argentina, Cuba, boa parte da África, a Europa comunista... Se o Brasil vai estar em 2014 melhor do que em 2010, vai depender muito do rumo que o mundo tomar, e é difícil imaginar um alinhamento de condições tão positivas para o Brasil quanto nos últimos oito anos. A missão da próxima equipe econômica é reconhecer isso e não fazer concessões imediatistas que ameacem a prosperidade do país por gerações. Primum non nocere.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

1 bilhão de preços

Para os maníacos por inflação de curto prazo, o MIT lançou um projeto para recolher, diariamente, bilhões de preços de varejistas na internet. Mais de 70 países já estão cobertos. É interessante ver, para o Brasil, como o IPCA do IPGE diverge dos preços online - sinal de que o que o país compra pelo computador está longe de ser uma boa amostra da cesta de consumo média (nos Estados Unidos, por exemplo, os índices são bastante próximos).

Via The Big Picture.

Juros no Planeta Terra (e no Planeta Bizarro)

- Hoje o banco central da Turquia manteve pelo 12º mês consecutivo os juros básicos em 7% -- inflação em 12 meses rodando a 8,62% (Bloomberg).

- O banco central da Sérvia subiu em 1 ponto percentual seus juros básicos, que são os mais altos da Europa - 10,5%. A inflação anual está em 9,9% (Bloomberg).

- No Brasil (inflação em 12 meses: 5,2%), o mercado futuro precifica o juro médio do ano que vem a 11,70% (e subindo).

Mais uma entrevista de Jeremy Grantham

Na CNBC. Altamente instrutiva para quem gosta do tema.

Frase do dia - Bill Browder e a Londres barata

"Alguns administradores brasileiros de private equity  foram me visitar na semana passada e disseram que estão achando Londres barata. Isso me preocupou muito."

Bill Browder, fundador do fundo Hermitage Capital Management, em entrevista para a Agência Estado

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Os 12 Trabalhos de Dilma (parte 2 de 3)


5 - Reduzir a dependência de commodities

Todo mundo vê o lado bom de concentrar as exportações em commodities e deixar o câmbio se valorizar quando o mercado é otimista. Extrapolar essa prosperidade para o futuro é, no mínimo, arriscado. O Brasil precisa se preparar para anos em que o preço do minério de ferro, por exemplo, não sobe 80%. Ou para um cenário onde o pré-sal não é financeiramente viável. Enriquecer o país com commodities não é um fenômeno usual; é preciso ter, além de sorte, a disciplina fiscal de uma Noruega ou a abundância de um produto caro a custos de extração ridículos de uma Arábia Saudita. Por mais abençoado por Deus e bonito por natureza que seja nosso país, não nos encaixamos em nenhum desses casos.

6 - Desindexar a economia

Em 1995, dois anos antes de sua morte, Mario Henrique Simonsen escreveu um livro chamado 30 anos de indexação. Os 30 viraram 45, e os efeitos de anos convivendo com um regime de inflação alta seguem na economia brasileira. A fórmula do cálculo do salário mínimo é uma dessas aberrações (não que o salário mínimo não deva subir, apenas que isso não seja função da inflação passada); ainda temos tantas outras, de tarifas de concessionárias a preços de aluguéis. Se a indexação teve algum dia a utilidade de proteger algum poder de compra, hoje é uma maneira de alongar o efeito de choques inflacionários e diminuir o efeito da política monetária (e proteger alguns interesses, claro). Já é hora do país enterrar os anos 1980 também neste aspecto.

7 - Gerar empregos

A parte não tão simples do tal "bônus demográfico" que tanta gente tem atribuído ao país (população jovem, com muita gente entrando no mercado de trabalho nos próximos anos) é: como criar empregos para os novos participantes do mercado de trabalho? A exploração de commodities é muito mais intensiva em capital do que em mão-de-obra, e ainda precisamos investir muito em educação e tecnologia para poder produzir aqui tudo o necessário para a exploração do petróleo, para pegar um exemplo do qual o governo gosta. Enquanto isso não acontece, o país terá que investir muito em setores que empregam grande quantidade de trabalhadores não muito qualificados, como infraestrutura e construção civil.

8 - Domar o BNDES

Já cansei de falar sobre o BNDES aqui, e o Mansueto Almeida faz isso com muito mais propriedade do que eu. Simplesmente o padrão dos últimos anos não pode ser mantido. No futuro, o banco deveria se preocupar efetivamente em fomentar desenvolvimento econômico e social e, muito provavelmente, terá de lidar com as consequências de algumas más decisões de crédito. Como disse o mestre Paulo Vanzolini, os pecados de domingo quem paga é segunda-feira, e o BNDES andou pecando bastante.

terça-feira, 9 de novembro de 2010

(Mais uma) História Mal Contada no Sistema Bancário Brasileiro

Em novembro de 2009, a Caixa Econômica Federal pagou quase R$ 740 milhões por 35,4% do Banco Panamericano, do Homem do Baú.

Hoje foi anunciada uma "intervenção branca" no banco, a ser iniciada amanhã pela Caixa e pelo Banco Central. A intervenção foi ativada após o banco informar que vai receber do Grupo Silvio Santos, via um gentil empréstimo do Fundo Garantidor de Crédito, um aporte de R$ 2,5 bilhões (mais do que seria o valor de mercado de 100% do banco, mantidas as cifras do negócio com a Caixa), "em virtude de terem sido constatadas inconsistências contábeis que não permitem que as demonstrações financeiras reflitam a real situação patrimonial da entidade".

Pelo informado até agora, dá para imaginar que os balanços do banco devem estar sendo fraudados há algum tempo, já que parece remota a possibilidade de aparecer, repentinamente, uma perda de R$ 2,5 bilhões em uma carteira de R$ 12,6 bilhões de ativos. A pergunta da qual o contribuinte deve cobrar uma resposta é como foi feito, pela Caixa, o processo de due dilligence que levou um banco público a gastar R$ 740 milhões de dinheiro do contribuinte na aquisição da participação em um banco que em um ano de boas condições de mercado fez água. Este Show dos Milhões não tem a menor graça.


P.S. Outra explicação a ser buscada é para a presciência do mercado, que derrubou em 6,75% o preço das ações do banco na Bovespa antes do anúncio do aporte.

P.P.S. E a história só melhora... hoje o Valor disse que a fraude consistia em vender carteiras de crédito e mantê-las no balanço -- o revolucionário método das partidas triplicadas.

Há pouco a Moody's anunciou que está revisando as notas de crédito do Panamericano. Ainda bem que o investidor pode contar com um serviço tão eficiente para guiar suas decisões!

Novos estímulos para os EUA

Quando parece que imprimir dinheiro é a única solução disponível, aparece Scott Adams com mais uma ideia brilhante.

Os 12 Trabalhos de Dilma (parte 1 de 3)

Nota: era pra eu ter publicado este texto logo depois das eleições, mas demorei e escrevi mais do que eu imaginava, e achei melhor dividir em três partes. As outras duas devem aparecer até o final desta semana.

Tá lá. É a economia, estúpido. Ou melhor: é a economia junto com a sacada genial de que dar dinheiro aos mais pobres tem um custo relativamente baixo e um impacto socioeconômico (e eleitoral) enorme.

Acho que um aspecto essencial (e não muito discutido) do julgamento da qualidade do que dona Dilma vai fazer na economia é que ela está pegando o país perto do topo de uma melhora de muitos anos, ao contrário de Lula, que assumiu quando pouca coisa parecia poder piorar -- para ficar em dois indicadores (devo falar mais sobre o tema em breve), a Selic no dia da posse de sr. Luis Inácio era 25% ao ano, com o Ibovespa a 11 mil e poucos pontos. Só por esse "efeito base", vai ser muito mais difícil para Dilma mostrar serviço, pelo menos para os olhos do espetáculo público. Tenhamos paciência e bom senso, portanto.

Não acho que a qualidade da política econômica vá melhorar ou piorar sensivelmente. Pelo visto (e terrorismos da imprensa à parte), a equipe dos próximos anos não vai ser muito diferente da que está lá agora, pelo bem (a turma do Tesouro, Nelson Barbosa e a maioria do Banco Central) e pelo mal (vossa eminência Mantega e o BNDES -- por mais que eu ache que Luciano Coutinho entenda de economia, parece ter sido engolido pelo o que o coronel Nascimento chamaria de "sistema"). A novidade seria a volta do Palocci, mas acredito que ele é apenas um cara muito bem articulado e que aprendeu a dialogar com o "mercado", não imagino que ele tenha muitas ideias além das já conhecidas.

Listo abaixo os que acredito serem os doze grandes desafios do governo Dilma na economia, independente do cenário global (que, no fim das contas, vai ter um grande peso, senão o maior, no resultado final). Caso consiga atacar todos, Dilma não vai ganhar a imortalidade, mas provavelmente será lembrada por deixar um país mais robusto e preparado para o desenvolvimento:

1 - Baixar os juros

As taxas de juros são a maior aberração da economia brasileira. Todas as explicações para esse fenômeno que apareceram da estabilização da inflação até agora (fatores institucionais, baixa taxa de poupança, indexação, etc - tudo no livro que o Ilan Goldfajn organizou há alguns anos) são incompletas, e só fornecem algum racional quando tomadas em conjunto, o que, de certa forma, equivale a dizer que o juro no Brasil é alto porque aqui toma-se caipirinha, temos a maior população de jogadores de futvôlei e o país é habitat do tamanduá-bandeira -- tudo jogado num modelo vai "explicar" qualquer fenômeno que seja único do país, mas não necessariamente estabelecer uma relação válida de causa e consequência.

Não sou ninguém para desafiar as dezenas de PhDs que gastaram centenas de horas elocubrando sobre o assunto, mas pensemos numa provocação: o juro no Brasil é alto porque o Banco Central quer. Ou melhor, porque o Banco Central acredita que, se o juro for colocado num nível muito mais baixo, a inflação explode. Essa relação não é definitiva -- dá para pensar que a inflação sobe ou cai por um terceiro fator, e o juro acompanha a inflação (caso a turma d'A Mão Visível passe por aqui, já estou ouvindo os gritos de "quermesseiro"). O teste seria encontrar um banco central ousado (irresponsável, dirão alguns) para baixar os juros e esperar para ver o que acontece com a inflação. A literatura corrente já teria até a explicação: o Brasil teria conseguido escapar de um equilíbrio indesejável entre uma determinada meta de inflação e os juros necessários para que ela seja alcançada. Há um equilíbrio com juros altos, que leva a um problema fiscal (juros altos criando dificuldades para financiar a dívida e levando a juros ainda mais altos - a tal dominância fiscal) e um equilíbrio com juros baixos, que alivia o problema fiscal e faz com que a meta possa ser alcançada com um nível menor de juros. Isso deve ser o que o Brasil está buscando, e parece ensaiado entre Fazenda e BC: um ajuste fiscal nada excepcional levando o banco central a, quando a inflação cair um pouco, baixar os juros.

É claro que esse não é um processo suave e sem opositores. Imaginemos os fundos de pensão, cujos cálculos atuariais estão baseados em juros reais de longo prazo ao redor de 6%, trabalhando em um ambiente de juros reais perto dos 2%, que, supostamente, é a meta do governo até 2014. Muita conta de benefícios futuros não vai fechar -- e ninguém vai condenar os gestores por operarem com uma premissa irrealista de retorno dos investimentos, a culpa vai ser das "condições de mercado" (esse filme já está em cartaz nos EUA e na Europa). Outros problemas também vão aparecer, falo deles nos outros tópicos.

2 - Lidar com o problema do câmbio

Estando o real supervalorizado ou não, o fato é que no nível atual de taxa de câmbio as importações aumentam e as exportações se concentram em produtos primários, com o déficit em conta corrente dependendo da conta financeira para ser fechado. Nesse mundo de dólar fraco, volatilidade e juros baixos, várias empresas que só tem receitas em reais estão se metendo a emitir dívida no exterior, tentando baixar seus custos de capital. Em 2008, quando a liquidez externa secou, a mesma situação quase quebrou algumas das maiores empresas do país (sim, o problema foi mais com derivativos, cujo mercado é menos transparente e por isso não é possível afirmar que o nível de alavancagem é o mesmo - imagino que a alavancagem exista, mas seja menor). Dilma terá que lidar ou com o câmbio ainda mais valorizado, e a chiadeira de vários setores e acadêmicos, ou, posteriormente, com as consequências dos excessos de quem achou que o real só poderia se valorizar.

3 - Botar o país na rota do desenvolvimento

A publicação do último IDH lembrou para o Brasil que crescimento é uma condição não suficiente para desenvolvimento (talvez necessária). O país precisa investir no básico do bem estar humano para tentar nivelar melhor as oportunidades dos seus cidadãos. As queixas são conhecidas e nada novas: a educação básica é uma lástima, quase 40% dos domicílios do país não tem saneamento básico, a saúde pública tem inúmeros problemas... A parcela mais pobre do eleitorado, que votou em Dilma de forma maciça, precisa ter mais do que o Bolsa Família para que o país mude de patamar.

4 - Fazer (algum) ajuste fiscal

Esperar alguma melhor na "qualidade" dos gastos parece irreal (o PMDB não permitiria tal extravagância), mas não é pedir demais que o governo entregue pelo menos os tais 3,3% de superávit primário que o mercado tanto quer ver e tente, nesses quatro anos, zerar o déficit nominal (que é o que realmente importa -- superávit primário é um conceito "me-engana-que-eu-gosto" para o FMI que já foi longe demais). Se de fato os juros caírem, essa tarefa nem vai requerer tanto esforço, e colocará o país em uma posição muito confortável em um mundo onde as economias desenvolvidas estão deveriam estar pensando em como vão fazer para pagar pela dívida que acumularam nos últimos anos.

Imóveis em São Paulo, uma anedota

Qualquer um que vive em São Paulo hoje em dia consegue perceber a euforia com o mercado imobiliário -- vê-se gruas pela cidade toda, os jornais estão repletos de anúncios de novos empreendimentos (o André Barcinski fez uma observação hilária sobre isso) e todo mundo mais seus cachorros parece querer adquirir um imóvel, e estes só sobem de preço. Tudo isso junto sugere uma bolha em formação, como já coloquei aqui. Entretanto, nossos juros pornográficos dificultam colocar as coisas em perspectiva. Veja o caso abaixo, catado ontem numa mesa de botequim das mais animadas:

Um amigo comprou, em maio de 2001, um apartamento em uma das zonas que mais se desenvolveu em São Paulo desde então (Vila Leopoldina). O imóvel foi comprado por R$ 170 mil, e vale hoje algo como R$ 550 mil - o preço subiu, portanto, 223%. Parece espetacular, até olharmos os juros acumulados (CDI) no período: quase 290%. Pior ainda se considerarmos a liquidez e os riscos envolvidos na compra de um imóvel contra a moleza que é comprar uma LFT (título pós-fixado do Tesouro Nacional) e dormir em cima dela. Portanto, a real aberração no Brasil não são os preços de imóveis em São Paulo, mas sim os juros praticados pelo Banco Central. Bolha imobiliária, como nos acostumamos a ver em outros países, só quando esses juros caírem substancialmente (ou os preços de imóveis subirem de forma ainda mais frenética).

P.S. Anedotas tem valor... anedótico, eu sei disso. Dados de mercado imobiliário no Brasil, entretanto, ainda são paupérrimos -- nesse sentido, é muito benvinda a iniciativa do Banco Central, que, dizem as boas línguas, estão trabalhando para montar um índice de preços de imóveis.

Update (de ago/11): Tem um erro grotesco de cálculo de retorno neste post, uma atualização está aqui.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Música para os nossos tempos

Capa do novo álbum do Elvis Costello:


Se a música pop de fato é um termômetro importante do humor social, o pessimismo nos EUA ainda está em alta -- conta contra o fato de Elvis Costello ser um artista de outras épocas; quando os Black Eyed Peas ou a Ke$ha lançarem algo nessa linha, algo muito interessante vai estar ocorrendo.

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Political Compass

Estava devendo isso para os leitores.


Mais sobre o teste aqui.

Frase do dia - uma cutucada no liberalismo econômico

"The freest, most incentive-driven market economies in the world are not the United States or Hong Kong or even tax havens such as the Cayman Islands but failed states and gangster societies such as Somalia, Congo, and Afghanistan."

O editor do Times londrino Anatole Kaletsky, levantando um ponto elaborado pelo economista britânico John Kay, em seu novo livro Capitalism 4.0, que comecei a ler hoje (parece muito interessante, quando terminar, coloco uma resenha aqui).

Na foto, um lindo e liberal campo de papoulas no Afeganistão.

Gráfico do dia - IDH da América Latina

Uma pequena mácula para a turma do "nunca antes na história deste país".

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Som da Sexta - Harry Nilsson

A música dos créditos finais de Cães de Aluguel, do Tarantino.

World Rally Day

Isso está ficando ridículo...

Bernanke explica a decisão de ontem no Fed

Num editorial do Washington Post de hoje. Destaco o seguinte parágrafo:

This approach eased financial conditions in the past and, so far, looks to be effective again. Stock prices rose and long-term interest rates fell when investors began to anticipate the most recent action. Easier financial conditions will promote economic growth. For example, lower mortgage rates will make housing more affordable and allow more homeowners to refinance. Lower corporate bond rates will encourage investment. And higher stock prices will boost consumer wealth and help increase confidence, which can also spur spending. Increased spending will lead to higher incomes and profits that, in a virtuous circle, will further support economic expansion.

Tradução: queremos mais uma bolha. Bolhas são boas para a economia.

A pergunta incômoda, sabendo que toda bolha estoura, é o que fazer quando isso acontecer, os juros estiverem a zero e o efeito marginal de bilhões de liquidez na economia for quase nulo. Não consigo deixar de pensar que os EUA estão seguindo, passo a passo, o mapa desenhado pelo Japão nas últimas décadas.

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Frase do dia - uma homenagem ao Fed

"It is tempting, if the only tool you have is a hammer, to treat everything as if it were a nail."

Quer investir no Iraque? Seus problemas acabaram!

Uma companhia de Illinois lançou um fundo para investir no Iraque, que deve estar na chamada "fase de máxima convexidade". Considerando as alternativas do mercado, não vai demorar para alguém aparecer dizendo que o risco do investimento é "moderado".

Um filme sobre mercado financeiro que eu quero ver...

... nem que seja "só" pela Eva Green:

Al Pacino has set financial thriller "Arbitrage" as his next film. He'll star opposite Eva Green and Susan Sarandon.

"Arbitrage" stars Pacino as a hedge fund magnate who is in over his head and desperate to complete the sale of his trading empire to a major bank before his fraud is revealed. But an unexpected, bloody error forces him to turn to the most unlikely corner for help.

Mais em Variety.

P.S. Ainda não vi Wall Street 2.

A (talvez) última entrevista de Mandelbrot

A revista da Markit publicou o que deve ser uma das últimas entrevistas de Benoît Mandelbrot.



Update (4/nov): a coletânea do Edge em homenagem a Mandelbrot.

Para quem tem alguma dúvida do que o Fed vai fazer hoje...

Ontem a taxa efetiva dos Fed Funds fechou em 0,00% pela primeira vez na história. Os helicópteros estão chegando, os helicópteros.

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Uma pequena reflexão pseudoliberal pós-eleições

Nós (paulistanos, ditos democratas, supostamente bem educados -- deve valer também para outros grupos) precisamos parar de achar que existe um Brasil dinâmico, criativo, potência de commodities e tudo mais e um Brasil "que não sabe votar". Temos que reconhecer que não somos maioria e que, nem de longe, somos os que mais dependem do que acontece na política para colocar comida na mesa. Criticar, sim, mas sem deixar de reconhecer que, distorções à parte (sobretudo no legislativo, onde sei que meu voto vale menos do que o de outras regiões) o resultado das eleições é o retrato do país inteiro, com tudo o que ele tem de bom e ruim, certo e errado.


Amanhã quarta-feira voltamos à programação normal de economia, finanças e nonsense.