quarta-feira, 21 de outubro de 2009

O que está por trás do ataque a Vale

No post anterior (já estou escrevendo para leitores seriais... vejam a pretensão), escrevi que ia falar sobre o caso da Vale. Na verdade, pensando bem, sobre o caso em si não há muito o que escrever -- quem acompanha a imprensa está vendo a sequência de atos hostis contra a empresa, vindos de diversas instâncias do governo, nas mais variadas formas. O que preocupa, na verdade, é a motivação política do governo. Novamente: o sucesso relativo dos últimos anos está sendo usado para lubrificar a idéia da necessidade de um Estado maior e com mais influência na economia -- seja para implementar idéias "desenvolvimentistas", ou , simplesmente, para empregar mais "companheiros".
Não vejo problema com idéias "desenvolvimentistas" por si só. Não é difícil procurar na história diversos exemplos de saltos de desenvolvimento induzidos pelo Estado (a grande obra de David Landes, A Riqueza e a Pobreza das Nações, é cheia deles). Aqui, eu destacaria dois contrapontos ao que estamos presenciando: primeiro, que o aumento da presença do Estado na economia não necessariamente é benéfica para o investidor -- sobretudo quando este atua num horizonte de tempo relativamente curto quando comparado com o necessário para a concretização dos eventuais benefícios das políticas estatais (e isso engloba a grande maioria dos que investem no país). O caso da Vale serve de exemplo: talvez, no futuro, seja positivo a companhia transformar em aço o minério que produz para então exportar um produto de maior valor agregado. O problema é que, para isso, investimentos pesados devem ser feitos, num país de custo de capital altíssimo e com os riscos que estão presentes em qualquer empreendimento. A influência disso no valor atual da ação da companhia é altamente questionável, ainda mais contrastada com o otimismo que toma conta do mercado (embora não estejamos vivendo um mercado predominantemente guiado por fundamentos).
O segundo é o foco do governo e sua relação com o momento histórico. Um dos poucos benefícios do atraso no desenvolvimento (novamente citando David Landes) é poder aprender com a experiência passada de outros países, e usá-la para pular algumas etapas. Assim, o Brasil não precisa investir nos mesmos setores "quentes" de 70 anos atrás, sabendo que, por exemplo, hoje em dia a siderurgia cria poucos empregos, consome muita energia e gera pouco incentivo para inovação tecnológica. Menos ainda depois de já ter passado por uma fase de investimentos nesses setores (dona Dilma andou citando a China como exemplo... só esqueceu de lembrar que, numa "sequência evolutiva", eles ainda estão algumas décadas atrás de nós. Para ficar em um indicador, o Brasil atingiu o nível de renda per capita ajustado pela inflação que a China ostenta hoje em 1972). Assim, faria mais sentido incentivar o empreendedorismo e setores capazes de absorver mão-de-obra, quaisquer que sejam -- por que não começar, por exemplo, com um programa para implementar sistemas de esgoto e saneamento básico país afora?
Todas essas observações não são novas, nem originais, nem obscuras, e pouco ideológicas. No caso brasileiro, a idéia do Estado maior não parece estar atrelada a uma tentativa consistente de fazer com que o país dê um salto de desenvolvimento, mas a uma visão de que é necessário aproveitar o momento para concentrar mais poder e/ou implementar idéias atrasadas. Visão, portanto, essencialmente conservadora -- seja no sentido de tentar perpetuar e fortalecer uma classe privilegiada de burocratas, seja na falta de ousadia para mudar e experimentar. Olhando bastante de cima, ainda sigo otimista com o futuro do país, mas devo admitir que parecem ter aumentado as chances de, novamente, darmos dois passos para trás para dar um a frente.

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