segunda-feira, 22 de outubro de 2007

Desserviço ao Brasil

Eu sou leitor da Folha de São Paulo desde que me entendo por gente (talvez até antes disso). E, como sabemos, uma vez que algo vira hábito, é difícil livrar-se dele. Mas, além do hábito, ainda acho que a Folha é um bom jornal, com bons colunistas, matérias pertinentes e alguns bons editoriais. O que, às vezes, me dá vontade de parar de ler a Folha são as suas visões do século retrasado. Hoje, por exemplo, a manchete principal (da capa, não só do caderno de economia) diz que "Estrangeiro lucra o dobro com dívida do governo". Dois fatores explicam esse "fenômeno": a valorização do real e a isenção de imposto de renda para os investidores não-residentes. Isso não deveria ser novidade para ninguém que acompanha minimamente o mercado financeiro: quando o estrangeiro compra um título brasileiro, além dos riscos de crédito e de juros, ele toma também um risco de moeda, que pode ou não ser neutralizado com uma outra operação (hedge). Como o hedge tem um custo não desprezível, e a tendência da moeda tem sido de valorização, a maioria dos investidores opta por carregar esse risco. Da mesma forma, se o real se desvalorizasse, os investidores teriam parte dos seus ganhos corroídos - e duvido que a Folha noticiaria algo do tipo "Estrangeiro lucra a metade com dívida do governo".

Já a isenção do IR faz parte da política de administração da dívida. Vários estudos (posso indicar um da ANDIMA, disponível aqui) mostram que, no caso de países como o Brasil, a abertura do mercado de dívida pública para estrangeiros ajuda a melhorar o perfil da dívida, tanto em sua composição (a divisão entre títulos pós-fixados, pré-fixados e indexados à inflação) quanto em sua duração (estrangeiros tendem a preferir títulos mais longos). A isenção do IR, nesse contexto, é um incentivo para a entrada de capital estrangeiro, o que facilita o gerenciamento da dívida e acelera a convergência para uma estrutura ótima para os passivos do país (traduzindo, outros estudos indicam uma composição ótima da dívida - onde a evolução dos passivos do país, a dívida, é compatível com a evolução dos seus ativos, basicamente a arrecadação de impostos).

Ao dar destaque para o que não deveria ser notícia, a Folha contraria a sua premissa ("Um jornal a serviço do Brasil", é o que se lê no topo da primeira página de cada edição) e alimenta as visões mais toscas de repúdio ao capitalismo global - as do tipo "capital estrangeiro prejudica o país, estrangeiros tem lucro fácil". Infelizmente, em certa medida, parece ser esse tipo de visão que predomina na edição do maior jornal do Brasil. Tanto pior para o país.

2 comentários:

Anônimo disse...

Só eu faço comentários aqui???

Acho que você perdeu um pouco o foco... a grande manchete da Folha é: "RAIKKONEN SUPERA FAVORITOS E LEVA TÍTULO".

Já te apresentei o Balu??

Unknown disse...

Eu te aconselharia a passar a ler o Estado de São Paulo.